Espadas Afiadas e Feitiços Sinistros foi minha porta de entrada nos jogos do movimento OSR (Old School Revival), conheci através de indicações de amigos e decidi comprar o material físico após cair no seminal blog Pontos de Experiência e descobri o canal de mesmo nome no YouTube, ambos do grande Diogo Nogueira, reconhecidamente um dos maiores nomes do RPG nacional.
Recentemente terminei uma campanha de Citycrawl de 10 sessões, e aqui nesse post vou comentar minhas experiências com o jogo e com o desenvolvimento de um cenário urbano junto com a comunidade.
Um jogo de Espada e Feitiçaria Pulp
EA&FS (Espadas Afiadas e Feitiços Sinistros) é um jogo de Espadas e Feitiçaria com regras leves e espírito Old School, como o próprio autor define na capa. O livro básico é curto e direto, a versão brasileira tem cerca de 60 páginas no formato A5 e é tudo que você precisa para se aventurar. Além disso existem mais dois suplementos, o Addendum que apresenta regras opcionais, mais magias e tabelas, e o Livro do Criador que um compilado de ferramentas para geração de aventuras.
A temática de Espada e Feitiçaria aparece muito marcada no sistema e no cenário, todos os personagens dos jogadores no livro básico são humanos e existem somente três classes (aqui chamadas de arquétipos): o Guerreiro, o Especialista e o Conjurador representado os classicos personagens dessa literatura pulp.
O cenário é descrito ao longo do livro por citações e através das próprias mecânicas, por exemplo não existem magias de cura ou itens mágicos que possam curar. As cidades estados típicas dos contos de Espada e Feitiçaria são descritas como lugares cheios de facções corruptas, governos tiranos, guildas de ladrões e torres com magos loucos. Assim como na literatura Pulp dessa época, em EA&FS tudo é muito mais cinzento e o heroísmo não é foco do jogo.
O sistema, regras, mecânicas e dinâmicas
EA&FS mistura regras clássicas do D&D Old School, como rolagem abaixo do atributo, teste de moral, ataque das criaturas baseado no dado de vida e alta letalidade, com o foco em se aventurar e na construção de narrativas emergentes.
Mas o sistema também apresenta mecânicas mais modernas, como Dado Positivo e Negativo, Dado de Uso, Rolagem de Sorte e Vocação. Essa última é particularmente interessante pois funcionam como uma descrição aberta dada na criação da ficha que pode ser utilizada para negociar vantagens narrativas com o mestre, como por exemplo, o Guerreiro pode ter uma Vocação de Ex-Pirata, e em situações envolvendo navegação ou negociar com marujos ele pode rolar com um dado Positivo em testes.
Arte interna pag 26
Essa mistura de um jogo com “chassi” Old School e mecânicas modernas é bem interessante, de uma forma geral funcionou muito bem durante as sessões, apesar de ter sentido falta de algumas resoluções mais objetivas que comentarei mais a frente.
Uma Campanha de Citycrawl
Após adquirir e ler EA&FS, coloquei em mesa algumas vezes para experiências curtas, foram todas bem interessantes e divertidas. Na intenção de um mergulho mais profundo comecei a trabalhar um mini cenário baseado em uma Cidade Estado que é comum nessa literatura, então comecei a trabalhar um ferramental de Citycrawl e até desenvolver um kit para ajudar a rodar esse tipo de exploração. Cheguei a postar aqui no blog e dividir com a comunidade algumas ideias, aqui nesse link você pode ler sobre:
➤ 🔗 https://www.dialogoficcional.com/2023/02/citycrawl.html
A ideia do cenário surgiu de uma oneshot que aconteceu em um evento em 2021. Depois de expandir o material, criar algumas facções, distritos, mapas e o kit de Citycrawl foi hora de colocar tudo em prova fazendo playtests.
O cenário intitulado Dalimasum e o Céu Desestrelado foi então colocado em mesa, e conforme escrevia e testava compartilhei diversas versões preliminares com a comunidade nos diversos grupos de facebook e whatsapp das comunidades Old School.
Mapa de Dalimasum
A campanha então deu início com 4 personagens, dois Guerreiros, um Especialista e um Conjurador. A ideia geral do cenário gira em torno de explorar a cidade que é repleta de facções de bandidos e traficantes, um governo tirano, uma igreja de fé duvidosa e um grande problema místico assolando a cidade.
Ao final de 10 sessões os personagens estavam no nível 3, muita coisa aconteceu de forma emergente com eles mesmos criando conflitos conforme avançavam em suas ambições. Foi interessante perceber que apesar de ser bem enxuto e minimalista, o sistema suportou bem uma campanha com múltiplas sessões.
Outro ponto interessante, é que diferente do padrão OSR dos retroclones do D&D B/X, em EA&FS os personagens começam mais capazes no nível 1 e tem uma curva de evolução mais lenta, ainda assim essa evolução permitiu avançar para desafios mais perigosos, não somente devido a avanços de ficha, mas com aquisição de alguns itens mágicos, dinheiro, equipamentos e aliados.
Dalimasum e o Céu Desestrelado: Cenário de Aventuras
Dalimasum é uma cidade-estado típica dos contos mais vis de Espada e Feitiçaria. Distritos dominados por guildas de ladrões, um governo sádico e corrupto, mercados ilegais, lojas de tomos antigos, estalagens sujas e templos de deuses esquecidos podem ser encontrados nos becos e praças. Qualquer aventureiro recém chegado logo escuta três rumores que circulam nas tavernas da cidade:
Um problema com os relógios
Os relógios estão sempre atrasados ou adiantados. O habilidoso relojoeiro Eduaro não consegue explicar o que está acontecendo. O relojoeiro já checou dezenas de vezes centenas de relógios e os mecanismos estão perfeitos. O velho mago Tumtu diz que o problema está relacionado ao fundamento.
O bardo depressivo
O mais festivo e por vezes louco bardo da cidade de Dalimasum, conhecido como Virardu, caiu em uma depressão profunda após seu gato Farinha morrer. O problema é que as canções do bardo Virardu agora são tristes, e uma onda de depressão começou a se espalhar, levando à três suicídios até então.
O céu sem estrelas
Por fim, um outro fato estranho: dentro dos limites da cidade, durante as noites, o céu não possui estrelas.
Com o fim dessa jornada, um cenário urbano foi desenvolvido. Eu aproveitei para estruturar tudo que foi produzido, criando tabelas aleatórias, NPCs, novas criaturas, distritos e facções. Fiz a diagramação do material e tive ajuda de muitas pessoas para ir revisando o material.
Agora depois dos playtests o material está em sua revisão final e algumas artes estão sendo produzidas por parceiros da comunidade para serem inseridas. Logo mais devo lançar itch de forma gratuita para a comunidade, assim que estiver pronto devo fazer um novo post apresentando tudo que vem junto no livreto.
Críticas e soluções alternativas
A minha maior crítica ao sistema está na mecânica de evolução, o jogo adota uma abordagem similar de jogos modernos, em que a passagem de nível é dada por número de aventuras finalizadas. Entretanto, eu fiquei com certa dificuldade em definir o que é “uma aventura”, pois matar goblins que assolam uma plantação pode durar meia sessão, enquanto se embrenhar em uma dungeon grande e cheia de perigosos pode durar 4 ou 5 sessões. Talvez esse último exemplo poderia ser dividido em múltiplas aventuras para ter um certo equilíbrio? Não sei dizer.
Em um jogo com foco em superação desafios e narrativa emergente, eu senti falta de um motor de evolução mais objetivo que pudesse tracionar melhor o jogo com foco no desafio. Apesar disso, essa crítica nem de longe torna o jogo ruim e parece facilmente contornável, já que temos outros sistemas de evolução por tesouros que facilmente podem ser acoplados no EA&FS.
O final, por enquanto...
A jornada por Espadas Afiadas e Feitiços Sinistros foi memorável, muitas cenas marcantes aconteceram ao longo do campanha e o sistema me supreendeu positivamente ao suportar um jogo mais longo que durou várias sessões. Espero logo mais poder compartilhar a versão final do cenário que foi construído com a ajuda de diversas possoas da comunidade.
Provavelmente esse é um sistema que irei voltar para visitar em um futuro próximo!
• • •
Se você usa twitter me segue lá pra gente trocar uma ideia sobre RPG! 🔗 twitter.com/icaroagostino
Bem legal ícaro. Eu já mestrei uma e joguei outra campanha com esse sistema e no geral gostei bastante. Bem simples e ágil.
ResponderExcluirSim, é uma otima alternativa pra OSR com uma forte textura de Espada e Feitiçaria
Excluir